segunda-feira, 26 de abril de 2010

Coleta seletiva em Votorantim

Merece ser acompanhada com atenção a experiência “profissional”, por assim dizer, da cidade de Votorantim com a coleta seletiva de materiais recicláveis, tendo em vista a parceria entre a Prefeitura e a Cooperativa dos Catadores de Material Reciclável de Votorantim (Coopervot), firmada na quinta-feira (22).

Até agora, a coleta votorantinense seguiu o padrão de tantas outras cidades, onde o cooperativismo ganhou força a partir da década de 1990, explorando um nicho desprezado pelo mercado, como alternativa para o desemprego. Nesse sistema, a cooperativa coordena a coleta, limpa e separa os materiais com valor de mercado, revendendo-os para sucateiros e retirando, dessa forma, do próprio material obtido o sustento de seus cooperados.

O modelo, como já abordamos neste espaço (“Conquista ameaçada”, 9/9/2009, e “A economia do lixo”, 6/3/2010), tem muitos pontos positivos mas tem, também, um ponto falho, que é colocar um serviço público importante a reboque de um mercado instável, em que os produtos recicláveis nem sempre conseguem uma cotação vantajosa e que compense retirá-los das ruas.
Mesmo com o apoio do poder público, que tem facilitado o trabalho das cooperativas fornecendo galpões e equipamentos, a coleta, enquanto modelo autossustentável, já demonstrou na prática que é incapaz de oferecer uma solução abrangente para o problema dos resíduos reaproveitáveis. E a prova disso é que as cooperativas, tanto em Votorantim quanto em Sorocaba, retiram apenas uma ínfima fração (pouco mais de 4% e 2%, respectivamente) do volume de material descartado pela população e que poderia ter algum aproveitamento econômico.

O projeto de Votorantim é ambicioso pelas metas e pelo grau de comprometimento do poder público, embora ainda trate o financiamento à cooperativa como “subsídio”, quando o termo correto, até por uma questão de reconhecimento à relevância social, econômica e ambiental da coleta seletiva, seria “remuneração”. Subsídio (contribuição, ajuda, subvenção) é pouco para definir a importância de se recuperar o lixo reciclável, que encarece a coleta do lixo orgânico e encurta a vida dos aterros sanitários, comprometendo o solo com materiais que levam séculos para se decompor.

Um dos pontos interessantes do projeto é a utilização de caminhões, em vez dos tradicionais carrinhos puxados pelos catadores. Os carrinhos de tração humana são insalubres e perigosos, já que expõem seus operadores ao sol e à chuva, ao risco de atropelamentos e de ferimentos físicos, além do estresse físico que sua condução acarreta. A substituição por veículos automotores é uma inovação humanizante, desde que se ofereçam garantias de aproveitamento integral dos atuais carrinheiros, sem esquecer que sua absorção não deve incluir exigências relativas a habilitações específicas (como grau de escolaridade e CNH, por exemplo), já que estas desvirtuariam completamente o sentido social da coleta.

É interessante lembrar que, para que as cooperativas de reciclagem possam ser contratadas sem licitação (ou seja, para que continuem tendo o mercado como exclusividade sua, sem precisar competir com empresas privadas), precisam ser “formadas exclusivamente por pessoas físicas de baixa renda reconhecidas pelo poder público como catadores de materiais recicláveis” (grifo do jornal), nos termos da lei federal nº 8.666/1993 (Lei das Licitações). Se o critério social deixar de existir em algum momento, a exploração do serviço deverá, por força de lei, ser contratada mediante concorrência.

Sem prejuízo desses aspectos, que certamente estão sendo levados em consideração, a parceria inspira justificado entusiasmo, até porque objetiva, mais que a expansão e regularização do serviço, um amplo trabalho de informação e conscientização dos votorantinenses. Tal preocupação demonstra uma visão consistente do problema ambiental, cujas repercussões transcendem os desafios presentes.

Editorial 24/04, do Jornal Cruzeiro do Sul

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